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Jean Leopold Dominique
3 de abril de 2000

Caso: Jean Leopold Dominique



Dominique foi assassinado a tiros em 3 de abril de 2000, quando chegava na estação de rádio.:

1 de janeiro de 2001
De Ana Arana

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Corpos que desaparecem, morte inesperada de suspeitos e um grupo de personagens que supostamente conspiraram para matar Jean Leopold Dominique, 69, o mais famoso jornalista de rádio do Haiti. Esses elementos compõem uma história mais sofisticada do que as imaginadas pelos escritores de romances policiais.

Corpos que desaparecem, morte inesperada de suspeitos e um grupo de personagens que supostamente conspiraram para matar Jean Leopold Dominique, 69, o mais famoso jornalista de rádio do Haiti. Esses elementos compõem uma história mais sofisticada do que as imaginadas pelos escritores de romances policiais. Dominique foi assassinado a tiros em 3 de abril de 2000, quando chegava na estação de rádio. A primeira lista de suspeitos era longa – ex-simpatizantes da dinastia Duvalier e empresários corruptos. Recentemente, porém, a investigação indica que Dominique, um importante assessor do ex-presidente René Préval e amigo do presidente Jean Bertrand Aristide, foi aparentemente vítima de um conflito entre membros do partido político Família Lavalas, de Aristide.

Uma investigação realizada pela Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) descobriu que Dominique, um homem que passou sua vida defendendo os pobres do Haiti, combinando jornalismo e um ativismo político de esquerda, foi morto em uma conspiração aparentemente planejada e concebida durante vários meses por importantes figuras políticas ligadas a Aristide. Entre os apontados na investigação judicial como possíveis suspeitos estão o senador Dany Toussaint, uma figura maquiavélica com muito poder dentro do Lavalas, e vários outros seus aliados que fazem parte do governo de Aristide ou são membros do Senado haitiano. Segundo a investigação, esses funcionários públicos, como as evidências demonstram, consideravam a independência e honestidade de Dominique como uma ameaça à sua busca de poder e seu envolvimento em negócios corruptos. Várias fontes forneceram informações valiosas à SIP para esta investigação. Mas como a conspiração para assassinato envolve figuras poderosas do Haiti, a maioria só concordou em falar se não fossem identificadas neste relatório. São evidentes as ameaças ao juiz, testemunhas e investigadores neste caso. Em janeiro passado, um homem que estava supostamente passando informações sobre o crime foi morto em plena luz do dia em Porto Príncipe.

Até mesmo Michele Montas, viúva de Dominique, que legalmente pode ter acesso a detalhes sobre a investigação, hesitou em compartilhar o que sabe. "Sou parte da investigação, por isso preciso ter cuidado com o que revelo", disse.

O assassinato de Dominique chocou o Haiti porque ele era visto como um partidário total e crítico da Família Lavalas. Sua morte foi um sinal de que o movimento criado pelo presidente Aristide na década de 90 para se opor à corrupta dinastia Duvalier tem sérias fissuras internas. Antes de morrer, Dominique insistiu que um grupo de funcionários públicos corruptos ligados a atividades criminosas, tais como tráfico de drogas e roubo de carros, havia dominado o partido político. Revelou o nome de alguns desses funcionários do governo de Lavalas, importantes e corruptos, em seus programas de rádio, na esperança de provocar seu afastamento do partido. "Dominique pensou que tinha mais influência política do que tinha", disse um observador estrangeiro.

Atualmente, o Haiti está mais dividido e empobrecido do que quando o presidente Aristide foi colocado novamente no poder pelo Exército norte-americano, em outubro de 1994, depois de um golpe militar que o havia retirado do poder por três anos, depois de ter vencido as eleições presidenciais em 1990. Vários assassinatos políticos chocaram o Haiti nos últimos anos, mas nenhuma das vítimas foi tão leal por tantos anos ao Lavalas quanto Dominique. Nos primeiros dez meses após o assassinato, o governo perdeu um tempo precioso seguindo pistas falsas e a investigação foi seriamente prejudicada.

Foi só em outubro de 2000 que o caso teve algum progresso. Aparentemente, o motivo foi o desejo do presidente Préval de usar seus últimos meses no governo tentando solucionar o assassinato. A administração Préval dedicou mais dinheiro para proteção a testemunhas, para guarda-costas para a viúva de Dominique e para a segurança do juiz encarregado do caso, que já havia recebido sérias ameaças de morte. A decisão de Préval ocorreu apesar de suspeitas internas entre membros do partido Lavalas de que o caso teria um impacto negativo no segundo mandato do presidente Aristide. Como exemplo dessa paranóia, membros do partido disseram diretamente à viúva de Dominique, Michele Montas, que o caso representava perigo para Aristide.

A SIP acredita que uma solução rápida do caso de Dominique serviria para testar a decisão da administração de Aristide de respeitar a liberdade de imprensa no Haiti. O assassinato de Dominique já teve um impacto indelével no modo como os jornalistas trabalham. Várias ameaças à imprensa provocaram uma resposta internacional, mas o uso de grupos de patrulheiros para fazer pressão sobre a mídia contra reportagens críticas continua aparentemente sendo promovido pelos principais membros do Lavalas.


Dominique teve uma morte violenta em um país no qual os aliados políticos logo se tornam inimigos. "O que as pessoas não entendem é que essas pessoas que estão no poder hoje estão determinadas a ficar e não farão nada que pensem poder afetar sua base de poder. Dominique estava perto do poder e subestimou o perigo", disse Marvel Dandin, da Radio Kiskeya, uma estação de rádio independente que também foi atacada por partidários do Lavalas.

Aristide foi eleito presidente em novembro passado depois de eleições presidenciais e legislativas polêmicas. A maioria da oposição se recusou a participar das eleições presidenciais. Atualmente, essa oposição, reunida em um grupo chamado Convergência Democrática, que inclui quase todos os partido políticos, além de pessoas que antes pertenciam ao Lavalas, se recusa a entrar em negociações e escolheu um governo paralelo simbólico em nítido desafio a Aristide.

O segundo mandato de Aristide como presidente se inicia em uma época em que o país enfrenta sua pior crise política, econômica e de segurança pública. A menos que ele entre em acordo com a oposição, o país não receberá uma ajuda internacional no valor de 500 milhões de dólares. A ajuda internacional é necessária. O Haiti é o país mais pobre da América Latina, segundo as Nações Unidas – com 80% de desemprego, inflação de 15% e um crescimento demográfico de 2,1%. Os próximos anos serão muito difíceis para o Haiti.

A maior parte dos setores intelectuais e políticos no Haiti diz que o partido Lavalas contribuiu para a crise devido à sua incapacidade de tolerar dissidência e seu desejo de ignorar a corrupção entre seus membros. Lavalas continua sendo uma poderosa força política devido ao culto de popularidade de Aristide entre os pobres do Haiti.

O partido Família Lavalas de Aristide se tornou um paraíso para os grupos de patrulha, conhecidos como Chimères. Esses esquadrões são supostamente contratados para amedrontar a oposição. Durante o enterro de Dominique, membros desse grupo queimaram a sede do partido político do líder de oposição Evans Paul, um ex-partidário de Aristide.

A maioria das fontes que têm acesso à investigação sobre Dominique afirmaram acreditar que o presidente Aristide não estava interessado em se livrar de Dominique, o mais famoso líder do Lavalas já assassinado. Mas fontes estrangeiras e haitianas acreditam que setores dentro do Lavalas têm total independência de Aristide. Afirmam que o fato de Aristide não denunciar publicamente o assassinato de Dominique, a ocorrência de outros assassinatos políticos e ataques à oposição e à imprensa apenas encorajaram mais abusos.

Outros são ainda mais abertamente críticos a Aristide e duvidam do papel que desempenha nos círculos políticos do Haiti. "Ele continua sendo uma figura importante no Haiti e no Lavalas", disse uma fonte. "Nesses assuntos, não é preciso dizer nada. Um gesto de aprovação, qualquer gesto pode ser interpretado como uma aprovação tática", disse um especialista em Haiti.

Michele Montas, viúva de Dominique, concorda. "Acho que Aristide não tem nada a ver com a morte de Jean. Mas ele não tem controle sobre todos os membros de seu partido", disse, firme, quando lhe perguntaram sobre essa possibilidade. Montas ainda está abalada com a decisão de assassinarem seu marido, que foi fiel a seu partido até morrer. "É irônico", ela disse. "Nunca pensamos nessa possibilidade."

Pessoas próximas a Aristide disseram que Dominique era odiado por muita gente devido a seus editorias cáusticos em um país no qual as pessoas são mais controladas em suas críticas. Brian Concannon, advogado norte-americano que trabalha com um grupo de assistência jurídica que antes se chamava Advogados para Aristide, disse que muita gente queria se livrar de Dominique. Afirmou também que os jornalistas ocidentais estavam muito dispostos a apontar as pessoas próximas a Aristide apenas para agredir o recém-eleito presidente.

Política dos Estados Unidos

Seis anos depois da Operação para Manutenção da Democracia, que devolveu o poder a Aristide no que foi uma ambiciosa manobra militar, e depois de cerca de US$3 bilhões de ajuda internacional, a política do Haiti do governo Clinton está sendo considerada responsável pelo atual fiasco nesse país. "O que aconteceu com o governo Clinton foi que quiseram tanto ter sucesso que nunca questionaram os problemas conforme iam surgindo, e o resultado foi que a situação se tornou cada vez pior", disse uma fonte do Congresso.

A política norte-americana para o Haiti tem sido frustrada pela divisão que criou no governo de Clinton, colocando democratas contra republicanos de modo nunca visto desde a guerra dos contra, na Nicarágua. Para complicar a questão, os principais envolvidos na elaboração da política se envolveram exageradamente na política haitiana. Vários membros da Congressional Black Caucus, por exemplo, trabalham na Fundação Aristide e enviam mensagens ambíguas aos funcionários do governo haitiano. Do mesmo modo, organizações como o Instituto Republicano Internacional (IRI) tiveram como seu diretor de país um haitiano-americano cuja família havia sido pró-Duvalier. O IRI foi forçado a fechar seu escritório depois de vários ataques a seus representantes e à sua sede.

Os partidários de Aristide estão sempre suspeitando de tudo que seja americano, mas ainda querem a ajuda, que é parcialmente americana e parcialmente européia. O envolvimento do IRI em ajudar a organizar a Convergência Democrática, o indefinido grupo de organizações de oposição anti-Aristide, tem sido outra pedra no sapato, nesse país altamente paranóico. As pessoas querem tanto acreditar na má intenção americana que um rumor de que Dominique tinha sido assassinado pelos americanos foi totalmente aceito nos primeiros meses após o assassinato. Acrescente-se ao rumor um infeliz incidente no qual um informante importante e possível pistoleiro no caso acabou sendo um haitiano que tinha um relacionamento independente com o escritório de Negócios Públicos na embaixada dos Estados Unidos.

Dominique fez críticas intensas à política norte-americana até sua morte. Pensou que setores conservadores nos Estados Unidos queriam terminar com o Lavalas e que representavam um perigo às esperanças de Aristide de se reeleger à presidência. Meses antes de morrer, criticou o papel de organizações norte-americanas tais como IRI, IFES e USAID, que estavam diretamente envolvidas nos preparativos iniciais das eleições legislativas de maio. Em sua máquina de escrever, ele deixou um editorial inacabado sobre o papel que os Estados Unidos desempenharam no Haiti desde 1917.

Ironicamente, como acontece com tudo no Haiti, é o inimigo do país, os Estados Unidos, que estão dando continuidade ao processo. No caso de Dominique, pode muito bem ter sido a atenção norte-americana que tenha convencido Aristide a levar o caso aos tribunais, apesar de sérias oposições dentro de seu partido. Os Estados Unidos estão interessados no caso porque é um bom veículo para atacar poderosos funcionários do governo haitiano envolvidos no tráfico de drogas.

Mas Joanne Mariner, subdiretora para as Américas do Human Rights Watch, disse que é importante que o governo Bush vá além das drogas e veja o assassinato de Dominique como outros assassinatos políticos, como uma forma de ajudar o Haiti a melhorar seu sistema judiciário e acabar com a impunidade.

"O governo Bush deve ter como principal política acompanhar de perto o progresso de investigações como a de Dominique", disse.

O jornalista

Dominique, um jornalista irascível e crítico, fez vários inimigos devido aos editoriais cáusticos que apresentava nos programas de rádio pela manhã e à tarde. Seus inimigos na época em que morreu incluíam partidários de Duvalier, de direita, e partidários populistas do Lavalas.

Filho de uma mulata, de família de classe alta no Haiti, que tem uma estrutura de castas, Dominique era considerado um inimigo de sua classe devido a seu constante suporte aos pobres do Haiti. Era agrônomo formado e tornou-se jornalista de rádio na década de 60 com um programa de uma hora que apresentava na Radio Haiti. Em 1971, comprou a estação e começou uma escalada meteórica na profissão por causa de seu estilo bombástico e a disposição de desafiar os abusos de poder.

Era um orador apaixonado, com um domínio especial do francês e do crioulo. Dominique usava as ondas do rádio para se opor a François Duvalier, ou "Papa Doc", seu filho "Baby Doc", e às juntas militares que governaram o Haiti até a década de 90. Foi duas vezes exilado. Em 1980, depois de ter sua estação destruída, foi para os Estados Unidos com sua esposa, Michele, e voltou ao Haiti logo depois de uma revolta popular depor Baby Doc Duvalier, em fevereiro de 1986. Em 1991, quando um golpe militar depôs o presidente Aristide, exilou-se novamente nos Estados Unidos e retornou em 1994, quando o presidente Aristide retomou o poder com o auxílio do Exército dos Estados Unidos.

Tornou-se extremamente popular em todo o Haiti, especialmente entre os camponeses do interior porque sua estação freqüentemente abordava questões de posse de terra e agricultura. Sua estação foi a primeira a oferecer programas de rádio em crioulo, uma decisão posteriormente imitada por outras em um país no qual 90% dos cidadãos são analfabetos e falam crioulo, não francês, a língua oficial. "Dominique ajudou a estabelecer as bases para uma imprensa independente no Haiti", escreveu Jean Jean-Pierre, um jornalista que vive no exílio, em Nova Iorque.

Dominique e sua esposa apresentavam o "Inter Actualites", o programa de rádio matinal mais popular do Haiti, que tinha reportagens, comentários e editorial. Montas, jornalista norte-americana, apresentava as notícias nacionais, e Dominique lia as notícias internacionais e escrevia os editoriais e comentários da estação, que eram sempre ataques aos políticos e empresários corruptos.

Dominique, partidário de Aristide de longa data, aceitou o sucessor escolhido por ele, o presidente René Préval, que governou de fevereiro de 1996 a fevereiro de 2001. Préval, também agrônomo, e Dominique acreditavam em realizar mudanças no Haiti por meio do acesso político ao interior do país. Juntos fundaram o Kozepep, uma organização de camponeses para reuniões políticas, e começaram a ter problemas com os líderes do partido Lavalas, que os viam como concorrentes. Vários membros do Kozepep foram atacados por Lavalas no interior do Haiti. Apesar de vários problemas sérios terem afetado o governo Préval, inclusive sua decisão de dissolver o Parlamento, Dominique tinha esperanças com Préval.

"Ele era mais político do que jornalista", disse Max Chauvet, editor do Le Nouvelliste, o principal jornal do Haiti.

Na capital tropical do Haiti, os homens usam terno e gravata mesmo quando a temperatura chega a 40o, mas Dominique preferia trabalhar com camisas sem mangas e sapatos sem meias. No entanto, era um conservador irreparável. Disse a sua esposa que não permitiria que Lavalas, que significa purificação em crioulo, fosse dominado por funcionários corruptos.

Segundo Montas, Dominique continuou apoiando Aristide. Mesmo nas épocas em que outros membros proeminentes do Lavalas se tornaram parte da crescente oposição a Aristide, Dominique continuou dentro do partido. Em 1996, por exemplo, quando os líderes da Organização Política Lavalas (OPL), que apoiaram a primeira eleição de Aristide em 1990, se recusaram a endossar o desejo de Aristide de estender seu primeiro mandato presidencial, e se afastaram, Dominique permaneceu. Dominique juntou-se ao novo Família Lavalas de Aristide, ajudando a recuperar o reconhecimento popular do Lavalas, distante do outro, que se tornou conhecido como OPL. Dominique disse a Aristide em várias ocasiões que precisava tirar do Lavalas personagens que estavam envolvidos em corrupção e tráfico de drogas. No final, Dominique parecia ter perdido o apoio daqueles que protegia.

"O lema de Jean era transparência, verdade e participação", disse Montas, uma mulher elegante de 54 anos e de voz suave que continua à frente da Radio Haiti e que está determinada a manter o nome do marido nas notícias até que o caso seja solucionado.

Em maio de 2000, um mês depois do assassinato de Dominique, Lavalas ganhou 72 das 82 cadeiras na Câmara e 18 das 19 do Senado. Ganhou outras oito cadeiras nas eleições de novembro. Mas os métodos de contagem usados para contar os votos nas eleições de maio foram contestados calorosamente. Os votos contados em nove áreas foram declarados irregulares pela oposição haitiana e organizações internacionais independentes tais como a Organização dos Estados Americanos (OEA) e as Nações Unidas. "Se Dominique estivesse vivo, não teria deixado que isso passasse despercebido", disse um observador político.

O crime

No dia em que foi assassinado, Dominique chegou na estação de rádio no horário habitual – pouco depois das seis horas – para ter alguns minutos sozinho com seu editorial. O programa começava às sete.

Os assassinos aparentemente observaram a estação por duas semanas antes do assassinato. Durante esse período, Montas havia acompanhado Dominique à estação por causa de um problema de coluna. Essa não era sua rotina normal. Eles tinham horários diferentes e preferiam ir em carros separados. Em 3 de abril de 2000, Montas estava dirigindo seu carro pela primeira vez após muitos dias. "Parece que havia dois pistoleiros. Acho que um era para mim", explicou em uma entrevista em seu escritório no segundo andar da Radio Haiti Inter.


Dominique dirigiu até a entrada da estação na Rua Delmas, uma passagem que liga o bairro Petionville, de classe alta, ao centro de Porto Príncipe. Jean-Claude Louissaint, o guarda de segurança, abriu o portão de metal azul. Havia um homem vagando próximo ao local, mas Dominique não lhe deu atenção. Dois carros estacionaram em frente à estação com outro homem dentro.

Dominique estacionou e deu alguns passos em direção à porta da estação. O homem que estava a pé entrou pelo portão. Aproximando-se de Dominique, puxou uma arma e disparou contra ele sete vezes com balas mortais hollowpoint – para o caso de ele estar usando um colete à prova de balas. Uma bala atravessou sua aorta. O pistoleiro matou também o guarda de segurança. "Seria impossível para Jean sobreviver aos disparos", disse Michele Montas, que encontrou os corpos quando chegou à estação, alguns minutos mais tarde.

A investigação

A morte de Dominique provocou protestos e demonstrações públicas de luto. Dezoito mil pessoas participaram de seu enterro e de uma cerimônia realizada em um estádio de futebol. Porém, dez meses depois, os culpados ainda não foram levados à justiça. Seis homens estão presos, acusados como assassinos ou partícipes do crime. Mas a investigação anda a passos lentos, dificultada pela situação política do país que está se deteriorando e pelas demonstrações de bravura de pessoas que os investigadores afirmam estar envolvidas no planejamento e execução do assassinato.

Incidentes bizarros complicaram a investigação do assassinato, evidenciando a tendência do Haiti para o drama e o ocultismo. Em julho passado, Jean Wilner Lalanne, principal suspeito, morreu depois de um ortopedista retirar balas alojadas em suas nádegas – ferimento causado quando tentou fugir durante sua prisão. Lalanne, que era parte de uma gangue de roubo de carros, teria supostamente sido o contato entre os assassinos e os mentores do crime. Acredita-se que foi ele que forneceu os carros para a fuga. Quando a polícia reclamou o corpo de Lalanne para uma autópsia, ele desapareceu do necrotério. Fontes do hospital dizem que ele foi provavelmente enterrado em vala comum, nas quais são colocados os corpos de indigentes. O hospital aparentemente enterra os corpos rapidamente porque a luz é cortada por horas durante o dia devido à falta de energia. A explicação é estranha, visto que os funcionários do hospital sabiam que Lalanne era um suspeito importante no assassinato de Dominique.

Um fato surpreendente é o fato de o ortopedista que operou Lalanne ter sido posteriormente acusado de homicídio involuntário pelo juiz da causa. O médico não estava no país quando a acusação foi feita.

Dois advogados influentes, Jean Claude Nord e Gerard Georges, que também são suspeitos no caso porque ameaçaram Dominique em um programa de rádio algumas semanas antes do assassinato, representam o senador Dany Toussaint, suspeito no crime.

Depois, tem-se os "chimères", membros do Lavalas que desafiam a oposição e, ao que parece, são pagos por seus serviços. Gritam com o juiz sempre que ele chama os suspeitos para interrogatório.

Os líderes do Lavalas afirmam que os chimères estão fora do controle do Lavalas. Os jornalistas haitianos dizem que os chimères têm líderes que comandam seus protestos. Um deles estava nos jornais em janeiro. Paul Raymond, chefe da Comunidade Pequena Igreja de Lavalas, que funciona nas ruínas da St. Jean Bosco, a antiga paróquia onde Aristide iniciou sua carreira como padre, aterrorizou oitenta jornalistas haitianos, clérigos e políticos quando avisou que os chimères iriam matá-los e transformar seu "sangue em tinta, sua pele em papel e seus cérebros em tinteiros", se continuassem fazendo oposição.

Os haitianos levaram o aviso a sério e o governo foi forçado a levar Raymond aos tribunais para que explicasse as ameaças – seu advogado foi o super requisitado Jean Claude Nord, que também representa Toussaint e é suspeito no crime. Durante uma breve visita às ruínas da igreja no centro de Porto Príncipe, foram vistos chimères sendo colocados em caminhões e líderes do Lavalas dando as ordens finais para um grupo de carros que levavam os que estavam protestando para um outro local.

Os chimères podem escapar ao controle. No passado, multidões participaram do "Pere Lebrun", que significa matar alguém colocando um pneu em chamas no pescoço da vítima. Queimaram a sede da oposição e provocaram desordem em frente a estações de rádio e jornais que consideram como inimigos.

Um juiz "petit"

O juiz Gassant é um homem baixo e magro e que sorri com facilidade. Formou-se na Escola Nacional de Advocacia, na França, e é parte de uma nova geração de juízes do Haiti que levam seu trabalho a sério. Quando lhe perguntaram por que havia assumido o caso de Dominique, ele disse que "não poderia ter recusado a oferta por causa da integridade profissional". Mas no Haiti, as pessoas gostam de dizer que o juiz está praticamente carregando "um caixão embaixo do braço".

Entre outubro e janeiro, o juiz trabalhou sob terror. A investigação é perigosa, e Gassant, que faz as prisões com um grupo de policiais que usam máscaras para evitar serem reconhecidos, não tem pudor de revelar seu medo. Nunca esperou sofrer tanta pressão, mas está se mantendo firme. Iniciou uma investigação paralela sobre o assassinato de Lalanne para determinar se houve negligência grosseira ou uma tentativa direta de silenciar uma testemunha-chave.


Gassant é o terceiro juiz no caso. Dois juízes se afastaram após receberem ameaças de morte. Gassant assumiu o caso por causa do prestígio e do desafio jurídico e está se mantendo com dificuldade. Um dia, durante uma entrevista, chegou a chorar. Leva a sério as regras e regulamentações dos procedimentos legais, o que significa que os jornalistas não têm acesso à investigação. Isso é parte do "sigilo do processo", aplicado pelo sistema jurídico napoleônico do Haiti.

Os documentos do caso Dominique estão guardados em duas grandes caixas de papelão que o juiz mantém em um local não revelado. Sua família abandonou o Haiti e ele dorme em uma casa diferente a cada dia. Anda pela cidade em carros sem identificação e na companhia de guarda-costas e membros de equipe especial de resgate. Os assassinos esgueiram-se na escuridão de Porto Príncipe ou se escondem entre os pedestres que passam diante dos carros nos famosos engarrafamentos do Haiti. Dezenas de assassinatos políticos nos últimos cinco anos ocorreram em ruas lotadas e engarrafadas da cidade.

Há algumas semanas, o juiz pensou que estava realmente em maus lençóis: seu carro foi cortado pelo carro de Milien Rommage, um deputado de Lavalas e ex-segundo homem da força de segurança do palácio presidencial. A unidade foi citada por observadores internacionais como a base de onde foram planejados vários assassinatos políticos. Ao reconhecer o carro do juiz, Rommage gritou que podia tranqüilamente destruí-lo a tiros. As observações foram supostamente apenas bravata, mas o juiz tem recebido muitas ameaças de morte e o incidente ocorreu no momento em que enfrenta o Senado controlado pelo Lavalas, que estava ameaçando investigá-lo porque ele estava tentando intimar Dany Toussaint, que foi eleito senador nas eleições de maio de 2000.

Yvon Neptune, presidente do Senado e partidário de Toussaint, disse que o pedido do juiz para interrogar Toussaint era inaceitável porque vinha de um juiz "petit", ou seja, um juiz insignificante.

O impulso para as investigações do caso Dominique vem de Michele Montas, uma jornalista de primeira linha que só se envolveu com o submundo do Haiti quando o assassinato de seu marido forçou-a a ver um Haiti que não conhecia. "Jean foi assassinado porque estava querendo impedir que várias pessoas ganhassem muito dinheiro", disse. Ela usa a estação de rádio e todas os contatos que possui no governo Aristide para forçar o caminho e levar o caso adiante.

Montas conheceu Dominique quando foi trabalhar na Radio Haiti, no início da década de 70. Tinha acabado um curso de pós-graduação da Escola de Jornalismo da Columbia University e havia presenciado as demonstrações contra a guerra do Vietnã, em 1969. Dominique atraiu-a por sua paixão política. Ficaram casados 25 anos. Montas sofreu muito com sua morte, pensou em fechar a estação, mas com a ajuda de Gigi, filha de Dominique, retomou o trabalho um mês depois do assassinato. Jurou também solucionar o assassinato de seu marido. É uma missão perigosa, mas ela está decidida. "Quando mataram meu marido, me mataram também", explicou, em um inglês com leve sotaque francês e com os olhos cheios de lágrimas.

O governo Préval lhe forneceu quatro guarda-costas que a seguem por toda parte. Ela ainda parece em choque diante do que aconteceu. Imagens de seu marido estão em toda parte na estação da rádio e na sua casa. Na Radio Haiti, um retrato de corpo inteiro de um Dominique fotogênico dá as boas-vindas aos visitantes. Em casa, seus cachimbos e o boné de couro continuam onde ele os deixou. Montas continua na mira dos que planejaram e executaram o assassinato de seu marido. Às vezes pede mais guarda-costas. "Quando chegamos a uma pista muito quente", diz, com uma risada nervosa. Já escreveu seu testamento, mas acredita que os assassinos não irão atrás dela. Limitada pelo sigilo do processo, que protege a investigação, ela apenas escreve histórias sobre o caso quando teme que as investigações estejam comprometidas. "Pensaram que eu ia enfraquecer porque sou mulher".

Em fevereiro de 2001, antes do início do governo de Aristide, por exemplo, Montas suspendeu todas as transmissões na Radio Haiti por três dias. A ação foi um protesto contra uma moção para investigar o juiz Gassant pelo Senado controlado pelo Lavalas depois de sua terceira tentativa de forçar o senador Toussaint a testemunhar. "Eles precisam entender que não haverá impunidade nesse caso", acrescentou, apesar de ter consciência de que precisará de apoio internacional para dar continuidade ao caso dentro do labirinto que é o sistema judiciário no Haiti.

Quem matou Dominique?

No Haiti, onde se armam tantas tramóias, todos acusam todos pelo assassinato de Dominique. Ameaçado durante toda sua vida, Dominique não teve nenhum aviso específico nos dias que antecederam seu assassinato.

Para dar início às investigações, Montas forneceu à acusação uma lista de possíveis inimigos que poderiam ter assassinado Dominique. A lista incluía empresários que ele havia acusado de suposta corrupção em seus editoriais diários, políticos e ex-partidários de Duvalier.

No começo, o Lavalas apoiou a teoria de que Dominique teria sido assassinado por ex-partidários de Duvalier. Um nome que surgiu foi o de Leopold Berlanger, uma figura da oposição e dono da Vision 2000, uma estação de rádio que também foi atacada pelo Lavalas. No ano passado, Berlanger foi coordenador do Conselho de Observadores Nacionais, um órgão que supervisionou as eleições de maio. Dominique fez críticas abertas a Berlanger em um de seus últimos editoriais, acusando-o de ser parte de uma coalizão "que pretendia destruir o Lavalas". Berlanger tem cooperado com a investigação e não é mais um dos principais suspeitos, segundo fontes que têm acesso à investigação.

Belanger enviou uma carta a este escritório em 16 de março de 2001 para fazer alguns esclarecimentos, os quais são apresentados no final deste trabalho.

Observadores estrangeiros e investigadores do Haiti procuram pistas em um editorial de rádio que Dominique apresentou em 19 de outubro de 1999, seis meses antes de sua morte. O editorial foi um ataque direto a Dany Toussaint, na época senador. Falava-se, na época, que estaria interessado em se tornar chefe de polícia pela segunda vez. Toussaint foi chefe de polícia substituto durante o primeiro mandato de Aristide, depois que o Exército foi desbancado e uma nova força policial foi criada. Na época, dizia-se que Dominique estava preparando uma série de dossiês sobre práticas corruptas e registros de tráfico de drogas de vários membros do Lavalas, incluindo Toussaint, segundo várias fontes. Montas, entretanto, insiste que não havia nenhum dossiê desse tipo. "Jean apenas acusou as pessoas em seus comentários diários", disse.

O editorial de outubro foi apresentado durante um dos períodos mais delicados no Haiti no ano passado. Três meses antes, os Estados Unidos haviam encerrado um programa de treinamento policial. Vários policiais favorecidos por treinadores norte-americanos, e conhecidos por terem vínculos estreitos com o Lavalas, foram forçados a se afastar. O mais influente era Robert Manuel, secretário de Estado para segurança pública, que se exilou quando membros do Lavalas, entre eles Toussaint, fizeram uma campanha contra ele. "Primeiro vieram as pichações, e então ele soube que tinha de sair de lá", disse uma fonte policial. O editorial foi apresentado dias depois do funeral de Jean Lamy, um membro do Exército supostamente honesto e assessor da polícia nacional, que iria assumir o posto de Manuel. Dominique decidiu escrever o editorial porque Toussaint acusou Manuel pelo assassinato e Dominique entendeu que se tratava de uma luta de poder dentro da polícia e que Toussaint estava querendo assumir postos dentro da polícia.

A independência da polícia tem sido apontada como um dos traços do novo Haiti. Durante toda a história do país, a polícia e o Exército foram usados para os golpes caprichosos de quem estivesse no poder. A nova polícia deveria estar acima das questões políticas, mas alguns membros do Lavalas nunca estiveram contentes com o treinamento norte-americano, segundo observadores estrangeiros. Dominique suspeitava da influência dos Estados Unidos e apoiou a idéia de uma força policial independente, e atacou Toussaint por tentar exercer seu jogo de poder. "É uma estratégia ruim", avisou Dominique em um de seus editoriais. Mas depois disse o que muitos interpretaram como sinal de que sabia que Toussaint era um adversário difícil. "Se Toussaint me perseguir, vou denunciá-lo publicamente e me exilar novamente com minha esposa e meus filhos".

Toussaint não é o único suspeito e os investigadores acreditam que o assassinato tenha sido planejado por várias pessoas influentes. O juiz ainda está obtendo depoimentos preliminares de suspeitos e testemunhas que supostamente possuem informações úteis para o caso. Algumas das pessoas interrogadas pelo juiz que investiga o caso são Jean Claude Nord e Gerard Georges, os dois advogados que ameaçaram Dominique alguns dias antes de seu assassinato em um programa transmitido pela Radio Liberte, uma estação de rádio de Nova Iorque dirigida por ex-partidários de Duvalier; o senador Dany Toussaint, que respondeu a apenas uma das três intimações para interrogatório, e cujo advogado é Jean Claude Nord; o senador Jean Claude Delice, um membro do Lavalas e cujo carro foi visto perto da estação de rádio na manhã em que ocorreu o assassinato; membros da força de segurança de Toussaint; e dois ex-militares, Richard "Cha Cha" Salomon e Jacques Aurélus, ambos aliados a Toussaint, segundo os investigadores.

Seis pessoas estão presas sob suspeita de serem potenciais pistoleiros ou acessórios do crime. Possuem vínculos com gangues criminosas locais que operam em Porto Príncipe, segundo várias fontes ligadas à investigação.

O assassinato foi aparentemente planejado durante uma série de reuniões. Em uma delas, os mentores do crime se reuniram com o líder de uma famosa organização criminosa. As autoridades estão muito interessadas em um bandido conhecido como Ronald Cadaver.

Cadaver era membro da segurança de Aristide que supostamente lidera uma rede de proteção no centro de Porto Príncipe. Alto, moreno e com cerca de 30 anos, Cadaver é supostamente líder de várias gangues com vínculos a traficantes de drogas, ladrões de automóveis e outras gangues criminosas, mas seu trabalho é apenas manter as coisas funcionando.

As informações sobre Cadaver o associam a gangues que operam no porto de Porto Príncipe, que fica a menos de 1,5 km das ruínas da igreja St. Jean Bosco, ex-paróquia de Aristide. O território inclui o porto, no qual os barcos fazem o trajeto entre Miami e Porto Príncipe, e um mercado central no qual os vendedores se reúnem para comprar pilhas de roupas usadas que são vendidas na capital.

Segundo fontes que acompanham as investigações, os assassinos chegaram na estação de rádio em três carros. Dois estacionaram próximo à entrada e um terceiro na rua. O primeiro informante que se apresentou disse que os carros utilizados para a fuga foram um Cherokee branco e um Nissan Pathfinder vermelho. Os carros são extremamente caros no Haiti e, segundo os investigadores, um deles era alugado.


Dois dos supostos assassinos são irmãos que pertencem à conhecida Gangue Rua Nove, a qual, segundo fontes haitianas e internacionais, é especializada em assassinatos encomendados. Operam no centro da cidade, coletando dinheiro de extorsão de comerciantes, segundo os investigadores. Um suspeito é conhecido como "Tilou", mas seu verdadeiro nome é Jamely Milien. Seu irmão é Jean Daniel Jeudi, conhecido como "Gime". Tilou, 23, é um pistoleiro conhecido, segundo fontes da polícia. Ele afirma ser inocente. Não tem nenhuma fonte conhecida de renda, mas tinha em seu poder US$4.000 em seu poder e um telefone celular bastante caro quando foi pego pela polícia.

O terceiro suspeito preso também trabalha supostamente para Cadaver. É um haitiano que foi deportado dos Estados Unidos, sob rígidas leis de imigração que enviam criminosos não residentes de volta para seus países de origem. Dois dos outros homens na prisão são policiais com conexões com membros influentes do Lavalas. Um dos policiais, Ralph Leger, tinha em seu poder o Cherokee branco usado no assassinato, segundo fontes policiais. Outro suspeito que está preso é supostamente ex-membro da segurança do Palácio do governo, onde, segundo fontes internacionais, vários assassinatos políticos ocorreram.

Um suposto colaborador de Cadaver foi assassinado à luz do dia no final de janeiro. Gasolina, como era conhecido, estava aparentemente passando informações, segundo fontes que conhecem o assunto.

Os primeiros progressos nas investigações ocorreram quando um homem chamado Philippe Markington decidiu falar com o juiz. Conhecido em toda a cidade por vender informações, Markington identificou-se com uma carteira de identidade de profissional de imprensa e uma de policial. Disse que por coincidência estava perto do local do assassinato às seis horas do dia 3 de abril e que tinha visto tudo que havia acontecido naquele dia.

Mas suas informações eram tão "precisas", segundo fontes ligadas à investigação, que a polícia começou a suspeitar dele e o prendeu sob a suspeita de ser parte do grupo que executou o assassinato. Markington supostamente se envolveu no caso porque queria que o tribunal intercedesse e soltasse alguns de seus amigos que estavam presos por um outro crime.

Markington chegou até a tentar envolver a embaixada dos Estados Unidos no caso. Havia desenvolvido uma relação com o departamento de negócios públicos da embaixada dos Estados Unidos e se encontrado diversas vezes com Dan Whitman, desse departamento. Segundo um documento elaborado pelo governo haitiano, Whitman disse que havia se encontrado com o informante porque ele lhe havia fornecido informações sobre ataques à oposição. Interrogado pela SIP, entretanto, Whitman disse apenas que havia se encontrado com Markington porque ele representava uma organização da sociedade civil. Whitman disse que não sabia se alguém estava tentando envolvê-lo com Markington. Segundo ele, Markington lhe havia telefonado "algumas vezes" e ele tinha sido autorizado por seus superiores a receber suas visitas. Whitman disse que quando soube que Markington estava na cadeia "expressou sua preocupação com seu bem-estar, a ele e a funcionários do governo haitiano". Whitman disse que não pode "saber se era Markington ou pessoas ligadas a ele que estavam querendo envolvê-lo no caso".

Markington tem se revelado indispensável para as investigações. Apesar de negar saber alguma coisa sobre o caso, os investigadores acreditam que ele é parte do grupo de suspeitos. Algumas das primeiras pistas fornecidas por Markington foram a placa do Cherokee usado no assassinato. O veículo levou os investigadores a Jean Wilner Lalanne, ex-militar com conexões com Lavalas e que morreu depois da operação nas nádegas. Lalanne era próximo a Toussaint e conhecido membro de um grupo que rouba automóveis e leva carros roubados de Miami de barco e os vende no Haiti e na República Dominicana. Os carros usados são utilizados para lavagem de dinheiro do tráfico de drogas, segundo os investigadores.

Morre um suspeito

Lalanne foi preso em junho de 2000 e ferido nas nádegas quando tentava escapar. Passou 13 dias no hospital geral de Porto Príncipe, recusando-se a receber tratamento porque temia que fosse morto para que não pudesse falar. No dia em que escolheu um médico, um de seus advogados, aparentemente Ephesien Jeassaint, conseguiu que fosse transferido para um hospital particular onde Alix Charles, um ortopedista, o operou. Nunca se explicou por que um ortopedista operou Lalanne. Mas quando ele morreu, o médico entrou em pânico e ligou para Montas e para o juiz do caso. Depois de testemunhar para a acusação, deixou o Haiti e encontra-se em local desconhecido.

Posteriormente, Charles enviou uma carta a esta redação na qual, entre outros esclarecimentos, afirmava que o advogado de Lalanne não era Nord, como esse relatório afirmou inicialmente, mas sim Jeassaint. Explicou, também, que não estava em local desconhecido, mas em Nova York, e que saiu do Haiti em 17 de novembro de 2000 e foi admitido no Hospital Beth Israel por problemas cardíacos. Outros esclarecimentos de Charles estão apresentados no final deste trabalho.

A causa inicial da morte de Lalanne, segundo o atestado de óbito, foi infarto. Lalanne tinha 32 anos quando morreu e aparentemente gozava de boa saúde. Posteriormente, Alix Charles alterou sua versão e disse a um amigo, Pierre Alix Nazon, um urologista e colega, que Lalanne havia morrido de embolia pulmonar. Disse que Lalanne tinha uma fissura na bacia. Fontes da polícia negam essa informação. O juiz acusou Charles de homicídio involuntário. Fontes bem informadas disseram que, ao que parece, Lalanne havia morrido de envenenamento.

Dany Toussaint

Enquanto o corpo de Dominique ficava em exposição no caixão no estádio de futebol, um grupo de simpatizantes do Lavalas aproximou-se do caixão e dançou sugestivamente em torno dele, entoando slogans anti-oposição. No calor da hora, um dos simpatizantes colocou uma foto de Dany Toussaint dentro do caixão. Um dos sobrinhos de Dominique viu o incidente e retirou a foto. Os investigadores continuam tentando entender o significado do incidente. Para alguns, tratou-se de uma demonstração cínica. Qualquer que seja o significado, foi um gesto macabro.

Toussaint não tem se calado diante dos ataques e acusações referentes ao assassinato de Dominique. Chegou a acusar a viúva, Michele Montas, de ter planejado o assassinato. Seu advogado, Jean Claude Nord, acusou Michele Montas de ter organizado o ataque a Toussaint, para diminuir suas chances de concorrer às eleições presidenciais de 2006.

Toussaint é hoje um líder popular e influente do Lavalas. Acusado pelo congressista norte-americano Dan Gilman em abril passado de ser um dos principais traficantes de drogas no Haiti, Toussaint foi eleito senador depois de gastar milhares de dólares construindo campos de futebol nos bairros pobres de Porto Príncipe – um gesto que lembra o falecido traficante colombiano Pablo Escobar. Ele recebeu a maior porcentagem de votos nas eleições legislativas, sendo bastante popular entre os jovens, que constituem a maioria da população do Haiti.

Ex-militar, Toussaint aproximou-se do movimento político de Aristide no início da década de 90, depois de afirmar que havia se recusado a cumprir uma ordem de assassinar o ex-sacerdote. Em 1997, foi preso pelo Serviço de Imigração e Naturalização (INS) de Washington. Fontes de Washington afirmaram que funcionários do serviço de inteligência, que tinham informações suficientes sobre Toussaint, não as passaram a tempo para o INS. Toussaint foi libertado duas semanas depois.

Eleito com uma plataforma de segurança pública, Toussaint prometeu ser duro com os crimes, uma manobra irônica considerando-se os rumores sobre seu suposto envolvimento no tráfico de drogas. A eleição de Toussaint para o senado lhe deu amplos poderes no Haiti. Um deles é imunidade no caso Dominique. Mesmo se o juiz encontrar evidências suficientes que o levem aos tribunais, o Senado é controlado por Lavalas e nunca votaria para suspender a imunidade de Toussaint. O senado já armou tudo para Toussaint.

Toussaint enviou uma carta de esclarecimento para este escritório em 27 de março de 2001, que é apresentada no final deste trabalho.



Nota do Editor

O texto abaixo é a versão editada das cartas enviadas pelo Senador Dany Toussaint, pelo dr. Alix Charles e por Léopold Belanger para a SIP em resposta à publicação do relatório escrito por Ana Arana sobre a investigação realizada pela SIP sobre o assassinato do jornalista haitiano Jean L. Dominique, diretor da Rádio Haiti Inter.



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Carta enviada à SIP pelo Senador Dany Toussaint:

27 de março de 2001

Senhora,


Como alguns de seus colegas haitianos afirmaram, os jornalistas não deveriam buscar bodes expiatórios, deviam estar simplesmente interessados na punição do verdadeiro e culpado responsável. Mas para informar seus leitores, vou apontar algumas imprecisões e opiniões equivocadas em seus jornais:

Como a senhora pôde afirmar que as evidências (que evidências?) demonstram que esses dignitários (Lavalas) consideraram a honestidade e independência de Dominique como uma ameaça?

- "(...) o senador Jean Claude Delice, um membro do Lavalas e que é próximo a Toussaint, e cujo carro foi visto perto da estação de rádio na manhã em que ocorreu o assassinato" (página 11, 1o parágrafo). Só vi o rosto de Jean Claude Delice quando ele fez seu juramento no Senado da República. É membro da kozepep (organização de agricultores) e próximo a Jean Dominique. Jean Wilner Lalanne não foi membro do exército, portanto não tive nenhum relacionamento profissional ou de outro tipo com ele quando estava vivo.

- "Recentemente, porém, a investigação indicou que Dominique (...) foi aparentemente vítima de um conflito entre membros do partido político Família Lavalas, de Aristide". Logo depois de se ter dito que: "A primeira lista de suspeitos era longa – ex-simpatizantes da dinastia Duvalier e empresários corruptos." Todas essas pessoas são membros do partido político de Aristide?? Não há nenhum esclarecimento sobre esse ponto...?

- "Toussaint foi eleito senador depois de gastar milhares de dólares construindo campos de futebol nos bairros pobres de Porto Príncipe – um gesto que lembra o falecido traficante colombiano Pablo Escobar." Parecem estar tão interessados em me comparar a Pablo Escobar que fazem afirmações sem sentido. O Estado haitiano construiu apenas um estádio, o Silvio Cator, em todo o país, há dez anos. Fico me perguntando onde estão os outros que eu supostamente construí com apenas "milhares de dólares"??

Vocês também afirmam que: "atualmente, Toussaint é um líder popular e poderoso do Lavalas". Talvez seja essa a razão de minhas recentes dificuldades.

Em 1986, abandonei meu país para evitar o assassinato de líderes democratas, tais como jornalistas e padres. Em 1991, arrisquei minha vida em defesa do presidente Aristide durante o golpe de estado e tornei-me suspeito entre os haitianos e mesmo entre os políticos estrangeiros. Por que devo ser eu o único líder militar a ser processado??? Por que logo o único que se exilou duas vezes???

Dany Toussaint





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Carta do dr. Alix Charles

Março de 2001

Sra. Ana Arana

Sociedade Interamericana de Imprensa

Senhora,

Para sua informação, devo lhe fornecer as retificações necessárias a este artigo, que é prejudicial à minha pessoa.

Lalanne ficou realmente hospitalizado durante treze dias, mas devido a três ferimentos de bala em sua nádega esquerda, os quais causaram uma fratura na parte superior de sua coxa esquerda que não se curou durante os referidos treze dias. Seu advogado, sr. Ephesien Jeassaint, entrou em contato comigo para que eu fizesse uma intervenção na coxa fraturada.

Deixe-me esclarecer que a fratura de fêmur deve ser operada o quanto antes para evitar qualquer embolia pulmonar que possa vir a ocorrer. Todos os documentos médicos relativos ao sr. Lalanne, assim como raios-X realizados antes e depois da morte do enfermo, apresentando o diagnóstico, estão em poder da Justiça. Não tive oportunidade de conversar com a sra. Montas, mas faça um pequeno esforço, ligue para ela e lhe faça perguntas sobre esse assunto.

Não precisei ligar para o juiz; ele me ligou três dias mais tarde e me disse que fosse a seu escritório com o advogado da Rádio Haiti, sr. Mario Joseph, e um policial.

Deixei o Haiti em 17 de novembro para vir aos Estados Unidos, não para um destino desconhecido, devido a problemas cardíacos, e fui admitido no Hospital Beth Israel, em Nova York.

Nunca se afirmou que o sr. Lalanne havia tido nenhum infarto, conforme afirmado no relatório que fiz no dia da morte. A senhora sabe que escrevi o relatório sobre a morte com o diagnóstico de parada cardíaco-pulmonar provavelmente provocada por embolia pulmonar?

Não quer procurar o original do diagnóstico de infarto? Tive oportunidade de explicar isso, em 1o de julho, ao juiz que investiga o caso, que escreveu isso em seu relatório. Ele também possui uma cópia do relatório médico. Meu advogado é outro sr. Georges.

A senhora poderá, com uma simples verificação, confirmar que eu nunca disse nada diferente; sempre foi embolia pulmonar.

O sr. Lalanne morreu de fato de embolia pulmonar resultante de sua fratura de 13 dias de duração. Teve o privilégio de ter sua necropsia realizada pelo dr. Rodrigue Dazand, cinco dias após sua morte. O cadáver teria desaparecido três meses mais tarde, segundo o juiz. Não houve nenhum manipulação humana de sua morte enquanto o enfermo esteve nas mãos de dois anestesistas experientes, dr. Ivose Chrysostome e dra. Gina Georges e na presença do meu assistente, dr. Belano Benjamin.

Dr. Alix Charles




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Carta de Léopold Berlanger

16 de março de 2001.

O objetivo desta carta é também chamar a atenção para enunciados na sua história que possam sugerir aos leitores que meu nome "apareceu" relacionado a esse assunto, porque, e eu cito, "No começo, o Lavalas apoiou a teoria de que Dominique teria sido assassinado por ex-partidários de Duvalier". Objeto especialmente a essa insinuação, inadvertida, devido à forma como sempre me coloquei firmemente em oposição aos regimes Duvalier.


Em janeiro de 2000, fui eleito chefe do Conselho de Observadores Nacionais, uma organização disposta pela lei eleitoral, que incorpora vários setores de diferentes horizontes políticos, incluindo o Lavalas. Esse envolvimento é um dos mais recentes em meus esforços de promover a causa da democracia em meu país.


A missão do Conselho de Observadores Nacionais é garantir a participação de observadores competentes e nativos para as eleições e também inclui importantes organizações de direitos humanos, tais como Justiça e Paz da Igreja Católica; a Plataforma Haitiana das Organizações de Direitos Humanos (POHDH) e organizações de camponeses, tais como a Koze Pèp, que se originaram dentro do Lavalas.


A afirmação falsa de que o Conselho de Observadores Nacionais e eu estávamos de algum modo relacionados ao assassinato de Dominique pode ser oriunda de partidos que, com suas ações, têm repetidamente demonstrado desprezo pelo processo democrático e pela lei. Associar-me, da maneira que seja, ao regime Duvalier é igualmente ofensivo.


Léopold Berlanger

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